A Lei Anticorrupção (nº 12.846/13) completa cinco anos neste mês. Ela surgiu como uma resposta rápida do Congresso Nacional aos protestos de junho de 2013. Foi criada em agosto daquele ano entrou em vigor em janeiro de 2014.
Desde então, apenas seis estados e o Distrito Federal instauraram processos administrativos para apurar possíveis atos ilícitos cometidos por empresas contra a administração pública: Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais e São Paulo. São, ao todo, 21 empresas multadas e os valores das condenações somam pouco mais de R$ 8 milhões. Desses estados, o Espírito Santo se mostrou o mais eficiente na aplicação da legislação, respondendo por mais de 70% do total de punições.
Já os números da União são um pouco mais positivos. Dados da Controladoria-Geral (CGU) mostram que o governo federal havia instaurado 183 processos administrativos até janeiro deste ano e aplicado 23 multas, totalizando R$ 12 milhões.
Na maior parte dos casos (34,47%), o principal alvo é a construção civil e engenharia. Esses números se refletem no período de vigência da Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2014. A operação da Polícia Federal desbaratou grandes cartéis e redes de corrupção no setor, envolvendo a Petrobras.
A lista de processos, no entanto, não se restringe a esse setor. Inclui, por exemplo, empresas do varejo (13% das processadas), prestadores de serviço (9,6%), companhias de tecnologia da informação e telecomunicações (7,3%) e do setor de consultoria (5,7%).
Apesar de os números de processos serem baixos, o consultor e sócio da Compliance Total, Wagner Giovanini, ressalta que a lei ainda é recente e vê os resultados até o momento como positivos.
“A Lei Anticorrupção Americana de 1977 (FCPA) teve sua primeira grande condenação em 2001. No Brasil, o Decreto que regulamentou a Lei entrou em vigor em 18 de março de 2015, portanto, há pouco mais de 3 anos. Hoje, temos 177 empresas que já foram envolvidas e 21 delas com condenações. Por isso, eu vejo os números de forma positiva”, diz o consultor.
Giovanini diz ainda que “Compliance, Mecanismos de Integridade e Combate à Corrupção são temas muito recentes no mundo corporativo brasileiro”. “Há muita falta de informação, poucos profissionais capacitados e, por causa disso, os empresários estão, pouco a pouco, percebendo a importância de adotarem práticas alinhadas à Lei. A aparente lentidão da resposta corporativa faz parte de um processo de aprendizado, progresso da maturidade organizacional e adequação das empresas aos novos tempos (Lava Jato, prisões, condenações, entre outros assuntos massivamente tratados pela mídia). A aplicação das leis acaba acompanhando esse movimento”, explica.
Ex-diretor de Compliance da Siemens na América Latina por 26 anos, Wagner Giovanini ainda ressalta que “a cultura da ética e integridade não está permeada satisfatoriamente em toda sociedade e os nossos representantes são um reflexo do que somos”.
Além disso, explica ele, a própria lei imputa algumas dificuldades inerentes ao Estado Brasileiro, principalmente no procedimento para a sua aplicação. “No âmbito federal, há clareza de ser a CGU o órgão responsável por isso. Mas, nos Estados e Munícipios, essa responsabilidade recai sobre a autoridade máxima da entidade em face da qual foi praticado o ato lesivo, ou, em caso de órgão da administração direta, do seu Ministro de Estado. Assim sendo, pode haver envolvimento dos poderes executivo, legislativo ou judiciário, daquele local. Assim, a quantidade de órgãos que podem aplicar a lei é enorme, trazendo muitas discussões sobre como, quando e quem deve instaurar esse procedimento”.
Apesar das dificuldades ainda existentes no Brasil quanto a corrupção e a punição desses tipos de crime, Giovanini reforça que a lei já está trazendo reflexos “importantíssimos”. “Empresas estão começando a se preocupar com o tema e, com isso, temos diversas organizações com bons mecanismos de integridade, abraçando funcionários e fornecedores. O efeito ‘cascata’ será percebido em breve, pois ‘empresas íntegras só desejam se relacionar com empresas íntegras’, o que faz crescer a demanda por contratação de empresas que possuem mecanismos em conformidade com a Lei 12.846/13. Esse é um movimento sem retrocesso”, afirma.
Entenda
A Lei Anticorrupção Brasileira ou Lei da Empresa Limpa impõe penalidades muito s empresas que cometerem ilicitudes contra a administração pública, seja no Brasil ou no exterior, tais como corrupção, subornos, lavagem de dinheiro, fraudes em licitação, entre outras. Ela aplica-se a organizações de qualquer natureza, tamanho e segmento de negócio.
Segundo Wagner Giovanini, negligenciá-la, portanto, constitui um risco muito alto para qualquer empresa que se pretende ser sustentável e sobreviver no mercado. O Mecanismo de Integridade, citado na Lei 12.846/13 e no Decreto 8.420/15 que a regulamenta, se implementado de forma efetiva, tem duas ‘funções principais: a) previne a ocorrências das ilicitudes previstas na lei, reduzindo drasticamente o risco de sua ocorrência; b) se mesmo assim uma ilicitude pontual ocorrer, o mecanismo servirá de fator de atenuação das penalidades.
“A corrupção é um dos maiores males que assolam o planeta. Dados da Transparência Internacional mostram que mais de 6 bilhões de pessoas vivem em países com alto grau de corrupção. Ela afeta a qualidade de vida das pessoas e subtrai da sociedade cifras gigantescas, que poderiam se investidas em saúde, educação, segurança, infraestrutura, dentre outras prioridades para a população. No Brasil, dados anteriores apontavam perdas na ordem de R$ 100 bilhões anuais com corrupção, mas, recentemente, há consenso que esse número passa dos R$ 200 bilhões”.
Nos dias 9 e 10 de agosto, um evento na seccional da OAB do Mato Grosso tratará sobre os cinco anos da Lei Anticorrupção. Será divulgado ainda o conteúdo total da pesquisa elaborada pelos advogados do Tauil & Chequer, Luiz Francisco Mota Santiago Filho e Louise Dias, que embasaram esta matéria.