Por Raquel Gallinati*
A persistência da violência urbana no Brasil frequentemente se torna opaca devido à cegueira ideológica, que impede alguns de enxergarem a verdadeira origem desse grave problema que assola a população.
A expressão "monopólio da violência" tem sua origem na definição estabelecida pelo renomado sociólogo Max Weber durante sua conferência "A Política como Vocação" em 1918.
Weber, nesse ensaio, estabelece uma concepção clássica para o pensamento político ocidental, atribuindo ao Estado o monopólio do uso legítimo da violência, quando necessário, no combate ao crime dentro de um território delimitado. Tal territorialidade é uma característica intrínseca ao Estado.
Tal monopólio, segundo Weber, pressupõe um processo de legitimação, sendo um princípio fundamental para todos os Estados democráticos modernos. Dessa forma, a definição do Estado soberano moderno está intrinsecamente vinculada ao monopólio do uso legítimo da violência.
Atualmente, observa-se uma tendência de minimizar a autoridade do Estado e as dores das vítimas, colocando-as como coadjuvantes do sistema de justiça. Há uma percepção de que todas as garantias são estendidas aos indivíduos que cometem crimes graves, como homicídios, estupros, tráfico de drogas e envolvimento com organizações criminosas. Isso se estende ao argumento de que esses criminosos são, de alguma forma, vítimas da sociedade.
Essa perspectiva levanta questionamentos sobre o equilíbrio entre garantias individuais e a efetiva punição de crimes, especialmente quando crimes hediondos estão envolvidos. A discussão se intensifica ao considerar como alguns elementos do sistema de justiça podem favorecer aqueles que cometem atos extremamente prejudiciais à sociedade.
Esse debate frequentemente se concentra na busca por um equilíbrio entre a proteção dos direitos individuais e a necessidade de garantir justiça para as vítimas. Encontrar um meio-termo que respeite os princípios fundamentais da justiça, ao mesmo tempo em que responsabiliza efetivamente os perpetradores de crimes graves, é um desafio contínuo na formulação de políticas públicas e na evolução do sistema jurídico.
A atuação das forças policiais é permeada por desafios sistêmicos e estruturais. A falta de recursos adequados, valorização e amparo legal em prerrogativas são obstáculos que comprometem a atuação dessas instituições.
A cegueira ideológica, por sua vez, impede uma análise crítica desses problemas. Quando a visão é deturpada por dogmas políticos ou ideológicos, torna-se difícil reconhecer e abordar a temática da segurança pública.
A compreensão da raiz da violência urbana requer um olhar além das lentes ideológicas, direcionando o debate para questões estruturais, sociais e históricas que alimentam esse problema.
O fortalecimento das instituições, investimentos em infraestrutura policial, bem como uma abordagem mais ampla que considere fatores socioeconômicos e educacionais são passos cruciais para enfrentar a violência urbana de maneira eficaz. A superação desse obstáculo requer um esforço coletivo para analisar criticamente as estruturas existentes e adotar medidas que promovam uma sociedade mais segura, justa e equitativa.
*Raquel Gallinati é Delegada de Polícia; Diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil; Mestre em Filosofia; e Pós-graduada em Ciências Penais, Processo Penal e Direito de Polícia Judiciária
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